Uma parceria que se consolida como eixo do futuro climático global

A relação entre Brasil e China, construída em torno de objetivos comuns para o clima e o desenvolvimento sustentável, entrou em uma fase madura e produtiva. Segundo análise do economista Ronnie Lins, diretor do Centro de Pesquisa e Negócios China–Brasil, o encontro entre as capacidades estratégicas dos dois países moldará, de maneira decisiva, a trajetória da ação climática mundial na próxima década.

oto: Ricardo Stuckert.

O Brasil oferece ao mundo sua biodiversidade, o conhecimento acumulado na gestão da Amazônia e a experiência em políticas públicas de proteção florestal. A China, por sua vez, aporta tecnologia, escala industrial e o maior ecossistema de energia renovável do planeta. Juntas, essas duas potências formam uma aliança que combina recursos naturais únicos, capacidade produtiva e visão de futuro.

Na avaliação de Lins, não se trata apenas de afinidade diplomática. Trata-se de um arranjo instrumental: o Brasil encontra na China um parceiro capaz de acelerar sua transição energética, enquanto a China vê no Brasil um aliado estratégico para testar, aprimorar e integrar suas tecnologias verdes em serviços globais.

Energia limpa, tecnologia e o salto da renovável brasileira

A presença chinesa no setor energético brasileiro é apontada pelo especialista como um dos motores da transição para uma matriz mais limpa e acessível. Empresas e fornecedores do país asiático já respondem por grande parte dos equipamentos utilizados no segmento solar e no mercado de baterias, abrindo caminho para a rápida expansão de sistemas fotovoltaicos, especialmente em residências e pequenos negócios.

Esse avanço democratizou o acesso à energia renovável: a queda expressiva no custo de módulos solares e componentes de armazenamento permitiu que milhões de consumidores entrassem na chamada energia solar distribuída. O impacto é visível não apenas na redução das emissões, mas também na diversificação econômica e no fortalecimento de cadeias produtivas regionais.

Paralelamente, cooperações em monitoramento ambiental também se ampliaram. Projetos conjuntos em observação por satélite, referência geográfica e novas técnicas analíticas aprimoraram a capacidade brasileira de rastrear desmatamento, identificar atividades ilegais e responder rapidamente a ameaças ambientais. Essas ferramentas servem tanto à governança climática do Brasil quanto ao avanço da própria China em tecnologias de gestão sustentável.

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Ciência, mobilidade elétrica e novas fronteiras de pesquisa

A cooperação científica entre os dois países avança em ritmo acelerado. Universidades, centros de pesquisa e agências de inovação estão conectados por projetos que exploram desde agricultura de baixo carbono até novas gerações de materiais com pegada reduzida de carbono. A inteligência artificial aplicada ao monitoramento de ecossistemas também tem se mostrado um campo promissor, permitindo análises antes impossíveis por métodos tradicionais.

A mobilidade elétrica é outro ponto de convergência crescente. Com o aumento dos investimentos de fabricantes chineses no Brasil, o país passa a integrar a arquitetura global de veículos elétricos, ampliando sua capacidade de produção, adaptação e distribuição. O debate também incorpora hidrogênio verde, indústria limpa e estratégias de inovação — todos vistos como pilares de uma cooperação climática mais ampla e duradoura.

Segundo Lins, esse conjunto de iniciativas já representa a primeira fase de uma parceria climática prática e tecnológica, alinhada às metas internacionais de mitigação de emissões.

Mecanismos estruturantes e a visão para a próxima década

Projetando o futuro, Lins defende que Brasil e China avancem para estruturas permanentes de inovação verde. Um mecanismo conjunto dedicado à inovação poderia apoiar startups, centros de pesquisa, programas experimentais e projetos de alto impacto em renováveis, biodiversidade, agricultura sustentável e monitoramento ambiental.

Outra proposta é a criação de um plano quinquenal de cooperação climática, nos moldes dos ciclos de planejamento chineses, permitindo coordenação de metas, previsibilidade e confiança para investimentos de longo prazo em áreas como mobilidade elétrica, hidrogênio, proteção florestal e redução de emissões industriais.

O especialista também aponta que o Brasil poderia integrar-se mais profundamente às cadeias de suprimentos da indústria verde chinesa. Isso significa ampliar a produção nacional de baterias, equipamentos solares e componentes para veículos elétricos — especialmente nas regiões Norte e Nordeste, que possuem vantagens logísticas e potencial produtivo. Além de fortalecer a soberania energética e acelerar metas climáticas, essa estratégia geraria empregos, dinamizaria economias regionais e reduziria desigualdades históricas.

A COP30, realizada em Belém, reforçou essa visão. Segundo Lins, o encontro abriu espaço para um novo tipo de cooperação internacional: mais operacional, inclusiva e aberta à agenda dos países do Sul Global. Essa configuração permite que Brasil, China, Europa e outros parceiros construam soluções conjuntas com base em inovação, responsabilidade climática e desenvolvimento compartilhado.

A parceria sino-brasileira, portanto, emerge não apenas como um eixo bilateral, mas como um ponto de irradiação para uma governança climática mais cooperativa e eficaz.